Mittwoch, August 24, 2005

A tristeza e a fúria




Num reino encantado onde os homens nunca podem chegar, ou talvez onde os homens transitam eternamente sem se darem conta ...

Num reino mágico onde as coisas não tangíveis se tornam concretas ...

Image hosted by Photobucket.com

Era uma vez ...

Uma lagoa de água cristalina e pura onde nadavam peixes de todas as cores existentes e onde todas as tonalidades de verde se reflectiam permanentemente ...

Aproximaram-se daquele lugar mágico e transparente, a tristeza e a fúria, para se banharem em mútua companhia.
As duas tiraram os vestidos e, nuas, entraram na lagoa.

A fúria, que tinha pressa (como sempre acontece com a fúria),
pressionada pela urgência -sem saber porquê-, banhou-se rapidamente e, ainda mais rapidamente, saíu da água ...

Mas a fúria é cega ou, pelo menos, não distingue claramente a realidade. Por isso, nua e apressada, pôs, ao sair, o primeiro vestido que encontrou ...

E aconteceu que aquele vestido não era o dela, mas o da tristeza ...

E assim, vestida de tristeza, a fúria foi-se embora.

Muito indolente, muito serena, disposta como sempre a ficar no lugar onde estava, a tristeza terminou o seu banho e, sem pressa -ou, melhor dito, sem consciência da passagem do tempo -, com preguiça e lentamente, saíu da água.

Na margem, deu-se conta de que a sua roupa já lá não estava.
Como todos sabemos, se há coisa que não agrada à tristeza é ficar nua. Por isso vestiu a única roupa que havia por ali:
O vestido da fúria.

Contam que, desde então, muitas vezes nos encontramos com a fúria, cega, cruel, terrível e agastada. Mas se nos dermos tempo para olhar melhor, apercebemos-nos de que esta fúria não passa de um disfarce e, por detrás do disfarce, na realidade, está escondida a tristeza.



Tirado do livro "contos para pensar" de Jorge Bucay